O que está por trás da fúria silenciosa?
Vivemos tempos em que a raiva se converte em atmosfera — uma camada fina e tóxica que recobre gestos cotidianos, conversas banais e até mesmo quietudes compartilhadas.
Não explode sempre, mas implode. E a implosão, às vezes, é ainda mais destrutiva, porque fagocita o bem e o belo aos poucos, sem revelar por fora o que está acontecendo por dentro.Passamos pelas ruas e vemos rostos aparentemente serenos, olhares que cumprimentam, bocas que riem em convenção. Mas, à noite — no quarto, nos grupos fechados, nas redes — essas mesmas faces exalam ódio, vomitam ressentimento, ensaiam a vingança como alívio.
Essa fagulha contida está por toda parte: na ironia ácida, na impaciência crônica, nos olhos que evitam o encontro, como se o olhar do outro fosse espelho demais.
Freud, em O mal-estar na civilização, já intuía: para viver em comunidade, é preciso reprimir o ódio, o desejo de posse, a agressividade. Mas o que é recalcado não desaparece. Ele se desloca, disfarça-se, ressurge. Às vezes, como culpa. Outras, como sintoma. Hoje, talvez como modo de vida: fúria legitimada travestida de lucidez.
Há uma raiva que se tornou forma de existir. Não a que se manifesta em socos e pontapés, mas a que se aloja no corpo como tensão constante; no rosto, como dureza; no coração, como frieza protetora.
Freud, em O mal-estar na civilização, já intuía: para viver em comunidade, é preciso reprimir o ódio, o desejo de posse, a agressividade. Mas o que é recalcado não desaparece. Ele se desloca, disfarça-se, ressurge. Às vezes, como culpa. Outras, como sintoma. Hoje, talvez como modo de vida: fúria legitimada travestida de lucidez.
Há uma raiva que se tornou forma de existir. Não a que se manifesta em socos e pontapés, mas a que se aloja no corpo como tensão constante; no rosto, como dureza; no coração, como frieza protetora.
Uma raiva sem nome, mas com endereço. Sem origem clara, mas com raízes fundas. Ela se alimenta da frustração, do desamparo não admitido, da impotência diante de sistemas que esmagam, esvaziam e exigem mais.
Talvez por isso a fúria pareça, hoje, a última forma de vitalidade em um mundo que asfixia: melhor arder do que desaparecer; endurecer do que quebrar; morder do que ser engolido.
Mas o que se esconde por trás dessa fúria silenciosa?
Talvez uma tristeza ancestral que nunca aprendeu a chorar. Um medo sem nome. Uma ternura esquecida, ainda procurando abrigo.
Este não é um chamado à indulgência com a violência, mas à escuta do que bate no peito do sujeito ferido, comprimido, desfigurado por ideais que nunca poderá alcançar. A raiva, quando olhada nos olhos, pode revelar um pedido de socorro, mesmo que vestido de espinhos.
Talvez por isso a fúria pareça, hoje, a última forma de vitalidade em um mundo que asfixia: melhor arder do que desaparecer; endurecer do que quebrar; morder do que ser engolido.
Mas o que se esconde por trás dessa fúria silenciosa?
Talvez uma tristeza ancestral que nunca aprendeu a chorar. Um medo sem nome. Uma ternura esquecida, ainda procurando abrigo.
Este não é um chamado à indulgência com a violência, mas à escuta do que bate no peito do sujeito ferido, comprimido, desfigurado por ideais que nunca poderá alcançar. A raiva, quando olhada nos olhos, pode revelar um pedido de socorro, mesmo que vestido de espinhos.
É tempo de não apenas denunciar os tempos sombrios, mas de perguntar com sinceridade: o que, ou quem, evoca a nossa fúria? A quem, ou a que, interessam os nossos ódios? Que parte da nossa humanidade entregamos para sobreviver? E o que, ainda, pode ser resgatado?
Talvez a esperança não esteja em apagar a raiva, mas em reconhecê-la como sintoma de que ainda há algo vivo, algo que não se conforma, algo que — se escutado com coragem — pode ser ressignificado, transmutado.
E se, no fundo, essa fúria silenciosa não for apenas resistência? E se for também uma forma — torta, aflita, sufocada — de saudade de amar?
Comentários
Postar um comentário
Este é um espaço para pausas sinceras, pensamentos partilhados, saudades ditas em voz baixa ou apenas sussurradas pela alma.
Se você quiser deixar um comentário, saiba que ele será lido com atenção, em silêncio e com respeito.
Todos os comentários passarão por mediação, não para controlar vozes, mas para proteger o espírito de Compassia — um lugar onde não há pressa, julgamento ou necessidade de acerto.
Aqui, você pode deixar fragmentos da sua travessia, perguntas sem resposta, lembranças que merecem pouso, ou palavras que brotaram do inesperado.
Se preferir, pode apenas ler e partir em silêncio — o silêncio também é presença.
Obrigada por estar aqui.
Que Compassia, mesmo que por um instante, te ofereça descanso.